domingo, 11 de setembro de 2016

O QUE E UM GOLPE DE ESTADO , COMO E EFETIVADO UM GOLPE DE ESTADO , BRASIL O TERRENO PARA GOLPES DE ESTADO, LEMBREM DE 1964 , LEMBREM DA QUARTELADA QUE DRRUBOU A MONARQUIA

O 18 Brumário de Luís Bonaparte : A discreta farsa da burguesia

Ao acompanhar o golpe de Estado que levou NapoleãoIII ao poder, na França do século 19, o alemão KarlMarx chegou a uma perturbadora conclusão: a históriaacontece como tragédia e se repete como farsa

Cássio Starling Carlos | 01/05/2006 00h00
Como uma obra se torna um clássico? No caso dos livros de história, alguns são elevados a essa categoria porque trazem uma pesquisa de fôlego e uma descrição reveladora da realidade. Outros viram referência porque, além da força da análise, criam um método novo e revolucionário para a compreensão da história. O 18 Brumário de Luís Bonaparte pertence ao segundo tipo. Seu autor é o alemão Karl Marx, filósofo, sociólogo, historiador e economista que nasceu na cidade de Trier, em 1818, e ficou eternizado como o grande teórico do comunismo.
Publicado em 1852, o texto descreve um golpe de Estado recém-ocorrido na França. Carlos Luís Napoleão Bonaparte, eleito presidente do país em 1848, resolveu impor uma ditadura três anos depois. A data escolhida para o golpe foi 2 de dezembro de 1851, aniversário de 47 anos da coroação de seu tio, o general e estadista Napoleão Bonaparte, como imperador da França. Essa repetição de Napoleões no poder inspirou Marx a formular a célebre frase com que abre seu texto, citando outro importante filósofo alemão: “Hegel observa em uma de suas obras que todos os fatos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa”.
A ironia de Marx está presente até no título do livro. Anos antes de se tornar imperador, o primeiro Napoleão também havia dado um golpe de Estado, em 9 de novembro de 1799, com o qual se tornou cônsul da França. No curioso calendário que o país havia adotado após a revolução de 1789, essa data correspondia ao dia 18 do mês de brumário. Ao chamar a obra de O 18 Brumário de Luís Bonaparte, Marx indica que o golpe dado por Napoleão III era apenas uma cópia daquele que fora dado antes por seu célebre tio.
Apesar de ter ficado famosa, essa forma de olhar para as “coincidências” históricas, em que a nova versão se transforma em caricatura, não é a idéia principal de Marx no texto. O que ele fez de mais revolucionário foi perceber, analisando aqueles fatos que haviam acabado de acontecer, que “os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado”. Ou seja: apesar de serem atores da história, as pessoas só são capazes de agir nos limites que a realidade impõe.
Os atos individuais não ocupam papel central na visão de Marx. Para ele, o motor da história é a luta entre as classes sociais, responsável por produzir as transformações mais importantes. De um lado, estão sempre os dominadores. De outro, sempre os dominados. Os primeiros são os que detêm os “meios de produção” (terra, propriedade privada, máquinas, indústrias etc.). Já os segundos são aqueles que só possuem a própria força de trabalho e que, para sobreviver, são forçados à servidão. Na Antiguidade, esse posto tinha pertencido aos escravos. No feudalismo, aos servos. Já no capitalismo, essa classe é formada pelos trabalhadores assalariados – o chamado proletariado, que vende sua força de trabalho para a burguesia.
Ao contemplar sua própria época, Marx via um confronto revolucionário no horizonte, provocado por essa distribuição injusta das posses, opondo os burgueses aos proletários. Nem era preciso olhar muito longe para entender que sua interpretação da história fazia bastante sentido. Para os pensadores do século 19, a Revolução Francesa era a grande referência. Segundo Marx, ela marcou a mudança de posição da burguesia no grande jogo. Voltando no tempo, essa classe social já tinha sido revolucionária, quando seus interesses econômicos, que se expandiam pelo menos desde o fim da Idade Média, encontraram no parasitismo da nobreza um enorme empecilho. Ao derrubar a monarquia, a burguesia foi se transformando aos poucos, em toda a Europa e depois no resto do mundo, na nova classe dominante. Assim, deixou de ser revolucionária e se tornou conservadora, preocupada em manter a ordem vigente.
Depois da ascensão da burguesia, o proletariado tomou seu lugar como classe oprimida e, portanto, potencialmente revolucionária. Nessa nova situação, ficou ainda mais claro que todo processo de acumulação de riqueza exige, para se concretizar, uma usurpação. Para que existam ricos, é necessário que existam pobres – esse é, simplificadamente, o raciocínio que Marx aplica a toda a história. Difícil é discordar dele.
Três anos antes de publicar O 18 Brumário de Luís Bonaparte, Marx escrevera, na companhia de seu amigo Friedrich Engels (veja quadro ao lado) um panfleto intitulado Manifesto do Partido Comunista. Nele, os dois explicam de forma resumida suas principais intuições sobre a dinâmica da história e interpretam as grandes transformações impostas pela burguesia. Segundo eles, para vender seus produtos, a burguesia precisava “instalar-se em todos os lugares, acomodar-se em todos os lugares, estabelecer conexões em todos os lugares”. Por causa disso, prosseguem, “a burguesia, através de sua exploração do mercado mundial, deu um caráter cosmopolita para a produção e o consumo em todos os países”. Raciocínios como esse, de extrema lucidez, se mantêm atualíssimos sem que seja preciso alterar uma vírgula sequer. O que era fato em 1848 continua a sê-lo – talvez ainda mais.
Apesar de ser um tanto complexo para o leitor atual, o texto pretendia explicar para as massas de trabalhadores a estratégia de dominação usada pela burguesia para se perpetuar no poder. Esse “esclarecimento” era parte de um programa revolucionário: consciente de sua situação, o proletariado teria enfim condições de se rebelar contra a burguesia. Seriam, mais uma vez, os dominados se voltando contra os dominadores. A revolução proletária seria um grande passo para que se adotasse o comunismo, regime político que acabaria com a propriedade privada e com as classes sociais.
Os conceitos lançados no Manifesto do Partido Comunista também estão presentes em O 18 Brumário de Luís Bonaparte. Mas, dessa vez, o desafio era interpretar acontecimentos recentes e bem conhecidos a partir de teorias que ainda estavam em formação. Ao analisar o golpe, Marx estava testando a solidez de suas idéias. E o que ele fez foi demonstrar que a atitude do sobrinho de Napoleão tinha sido apenas um resultado natural, quase previsível, dos rumos que a história da França estava tomando desde a revolução de 1789.
Ao falar da França de meados do século 19, Marx descreve toda a estratégia política, militar e institucional da burguesia francesa como um processo em que ela toma para si algo que, supostamente, deveria ser de todos: o Estado. Se Napoleão Bonaparte tinha imposto um Estado forte, imperial e expansionista, ele o fez não em benefício do povo, mas a serviço de uma só classe, a burguesia. Essa havia sido a “tragédia”. A “farsa” veio quando Luís Bonaparte, com um golpe de Estado, se transforma em Napoleão III. Para conseguir o poder, ele foi beneficiado por alianças entre partidos burgueses – o que, segundo descreve Marx, significou trair as lideranças proletárias e tirá-las do governo.
A engenhosa argumentação de O 18 Brumário de Luís Bonaparte descreve a democracia como um imenso tabuleiro, em que os interesses de diferentes classes são manipulados sob o mecanismo de representação do povo por políticos – uma fórmula normalmente tida como justa. Depois de ler o livro, é difícil deixar de perceber que essa forma de governo, presente até hoje, oculta uma imensa engenharia de pequenos acordos. Olhando desse modo, as repúblicas modernas, aparentemente legítimas, serviriam apenas aos burgueses.
Ao falar de Napoleão III, Marx constrói a imagem de um herói de araque posando com a fantasia de grande estadista, governando em nome da dominação da burguesia sobre as outras classes. Segundo disse o amigo Engels ao escrever o prefácio da obra, 30 anos após seu lançamento, “essa notável compreensão da história viva da época, essa lúcida apreciação dos acontecimentos ao tempo em que se desenrolavam, é, realmente, sem paralelo”. De fato, é impressionante como Marx foi capaz de olhar um momento específico e tirar dele uma explicação consistente para o modo como a política é feita no capitalismo. O modelo dos golpes napoleônicos estava pronto para muitos que vieram depois. E, desde então, a história continua a se desenrolar cada vez menos como tragédia e quase sempre como farsa.

Companheiro de luta

Engels era um bomparceiro intelectual - e aindaemprestava dinheiro
Muitas histórias nunca teriam acontecido se algumas duplas não tivessem se encontrado. O que teria sido, por exemplo, do cristianismo sem Adão e Eva? Ou da comédia sem o Gordo e o Magro? Ou do desenho animado sem Tom e Jerry? Pois o comunismo, como o conhecemos, não existiria sem o encontro de Karl Marx com Friedrich Engels. Filho de um industrial alemão, Engels nasceu dois anos depois de seu camarada, em 1820. Em 1844, publicou um texto chamado Esboço de uma Crítica da Economia Política, que influenciou decisivamente o pensamento do jovem Marx. Naquela obra, Engels analisava as conseqüências das más condições de vida do proletariado e da utilização de sua força de trabalho pela burguesia. Apesar de oriundo do meio burguês, ele conhecia de perto a situação precária dos trabalhadores, pois cuidava de uma das fábricas do pai em Manchester, na Inglaterra. Depois de se aproximarem, os dois jovens se associaram para escrever o Manifesto do Partido Comunista, publicado em 1848, texto que rapidamente virou referência para a esquerda de vários países. E a relação entre ambos não demorou a passar do plano teórico para o pessoal. Foi o apoio financeiro de Engels que permitiu a Marx sobreviver em Londres, onde havia se instalado em 1849, e ali dar continuidade a sua enorme produção teórica. Depois da morte do parceiro, em 1883, o cuidado de Engels foi fundamental para que o mundo viesse a conhecer na íntegra a obra mais famosa de Marx: ele editou e publicou o segundo e o terceiro volumes de O Capital, que haviam sido deixados inacabados pelo autor. Até morrer, em 1895, Engels seguiu escrevendo – fez, inclusive, prefácios de novas edições dos livros de Marx.

Saiba mais

Livro
O 18 Brumário e Cartas a Kugelmann, Karl Marx, Paz e Terra, 1997, R$ 42,50




































































































https://periodicos.ufrn.br/interlegere/article/viewFile/4840/3939

Resenha do livro: MARX, Karl. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. Disponível em: http://ateus.net/ebooks/geral/marx_o_18_brumario_de_luis_bonaparte.pdf. Acesso em: 08 jul. 2008. Estas Notas Preliminares de Leitura são uma breve apresentação do livro O 18 Brumário de Luís Bonaparte, procurando fazer uma discussão acerca de alguns pontos, considerados importantes, na obra de Karl Marx, como: lutas de classes, materialismo dialético, entre outros. Dessa forma, serão priorizadas as lutas pelo poder político e econômico em que estiveram envolvidas: a nascente burguesia francesa e as diversas classes socioeconômicas existentes naquele momento histórico, que culminaram no inesperado Golpe de Estado que colocou Luis Bonaparte à frente do governo francês, numa administração ditatorial que herdou o seu nome – Bonapartismo. Assim, como outros autores clássicos, Karl Marx juntamente com Friederich Engles desenvolveram um método próprio para a compreensão da sociedade. Esse consiste numa análise que leva em consideração a história, mas não somente ela. As relações materiais de produção têm um lugar central em todas as suas análises, sejam elas de cunho estrutural ou conjuntural. O método denominado de materialismo histórico dialético não teve propriamente uma obra que se prestasse a explicá-lo em seus mínimos detalhes; no entanto, sua aplicabilidade pode ser verificada claramente no livro O 18 Brumário de Luís Bonaparte”79 . 78 Bolsista do CNPq e orientanda da Profa Dra. Maria Lúcia Bastos Alves. 79 Escrito entre dezembro de 1851 e março de 1852. Revista Eletrônica Inter-Legere: Número quatro, dois anos 136 Neste, Marx trabalha toda a conjuntura social, política e econômica da França, em um determinado período histórico, que vai desde a eleição, que coloca Luís Bonaparte à frente do Estado francês, até seu Golpe de Estado (de 1848 até 1851). Embora este livro, e toda a obra de Karl Marx tenham sido estudados de maneira contundente aos longo dos anos e se encontrem muitos trabalhos escritos, a partir de suas idéias e conceitos, é sempre uma aventura relê-los. Muitas vezes significa redescobrir um fato novo, ou não tão novo assim, mas é que a relevância da compreensão da sociedade por Marx, naquele momento histórico, é imprescindível para a história da Sociologia, mesmo que esse autor não estivesse preocupado com a criação de uma nova ciência. É por isso que, reler ou escrever sobre Marx é uma forma de não deixar que seus esforços sejam relegados ao esquecimento e, mais que isso, saber que podem ser utilizados para interpretar o mundo atual, tamanha é a atualidade da maioria de seus constructos, daí terem se tornado clássicos. A feitura destas Notas foi estimulada, graças à leitura de várias obras de Marx, durante a disciplina Teorias Sociais Clássicas, na Pós-Graduação em Ciências Sociais, – Mestrado e Doutorado, ministrada pelo Prof. Dr. José Willington Germano, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em 2008.1, e esta, aqui privilegiada, foi apresentada em um seminário. Para isso, foram feitas algumas leituras prévias do livro, em questão e a apresentação do trabalho em aula. Após essa dedicação ao livro, a organização de um texto que pudesse facilitar o encontro de outras pessoas com a leitura marxiana se tornou uma responsabilidade clara. Então, como os caros leitores, que por ventura tiverem curiosidade em conhecer um pouco mais O 18 Brumário de Luís Bonaparte verão que este texto estará organizado de forma cronológica, tentando facilitar a compreensão de todos. Com a perfeita descrição e análise dos acontecimentos revolucionários de todo o período de 1848 até 1851, O 18 Brumário de Luis Bonaparte trata dos fatos que desencadeiam o período de ditadura do Estado Bonapartista,80 quando Luís Bonaparte assume o poder (através de um golpe) e governa em forma de império. Os leitores deste livro terão oportunidade de conhecer tanto os episódios como os caminhos percorridos, algumas vezes, circunstancialmente, outros premeditados, mas que desembocou num único trilho: o do governo centralizado numa só pessoa. É claro que não se anunciava desde o princípio esse fim, mas quando Marx diz: “Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob 80 Modelo de Estado instaurado por Luís Bonaparte na França, a partir do golpe de Estado, de 02 de dezembro de 1851. Esse modelo tomou tamanha abrangência que é possível analisar outros estados ditatoriais através dele, inclusive, na atualidade. Revista Eletrônica Inter-Legere: Número quatro, dois anos 137 circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado” (2008, p. 2). Ele nada mais quer dizer que o traçado das circunstâncias faz o presente e, que mesmo os homens se deparando com condições de existências legadas pelo passado, ainda assim, eles são os únicos responsáveis pela transformação da sociedade e mudança de suas condições existenciais. E seja lembrado que, para Marx, o homem sozinho não e o responsável pela construção de sua história, mas as massas, ou seja, somente a conjunção de fatores leva a um desfecho histórico-social. No decorrer do livro, é evidente o valor que é dado à questão das lutas de classes. Através do antagonismo entre as diferentes classes francesas, do século XIX, pode-se compreender como se dá o processo histórico. Cada classe a seu modo se dispunha a lutar pelo poder político como forma de instaurar e consolidar o seu estilo, modo de vida. A burguesia, por seu lado, encontrava-se em meio a uma busca desesperada pelo poder político, o qual garantiria como conseqüência a expansão do poder econômico, e, para isso, faz uso de expedientes diversos e, muitas vezes, perversos. A França, numa fase de monarquia absoluta, pré-revolução de 1789, apresentava um considerável atraso econômico. As precárias condições sociais da população contrastavam com os gastos excessivos de sua Corte, tanto em luxo quanto em envolvimento em guerras como: a da Independência dos Estados Unidos (1783) e a dos Sete Anos (1756-1763). A burguesia em ascensão passa então a questionar a estrutura do Ancien Régime, pois o Estado francês não respondia mais à realidade econômica suscitada pelas nascentes forças econômicas e produtivas, que estavam em gestação naquele contexto histórico e social. Destarte, em 5 de maio de 1789, têm início os acontecimentos que vão mudar consideravelmente a história da França. A Revolução Francesa não foi um acontecimento imediato, mas um processo que se estendeu durante um longo período, no qual forças políticas emergiram daquela sociedade marcada pela insatisfação, seja a porção da população que vivia no campo em precárias condições de existência ou a porção urbana da burguesia nascente que pretendia ampliar suas fronteiras comerciais. Mas, não cabe aqui um inventário do processo revolucionário como um todo, mas apenas uma pequena introdução, para que se possa dissertar sobre o jogo político e social pelo qual passava a França no período de 1848 a 1871. Por esse motivo, a burguesia sentiu-se muito à vontade em apoiar o emergente general Napoleão Bonaparte para representar seus interesses. Bonaparte assim o fez; ao chegar ao poder apagou do cenário daquela sociedade as instituições sociais que por ventura pudessem lembrar o antigo regime e, de alguma maneira, impedir o desenvolvimento das forças Revista Eletrônica Inter-Legere: Número quatro, dois anos 138 produtivas. Foram, então, criadas todas as condições favoráveis ao novo modo de produção. O poder ficara então concentrado em mãos de uma pessoa, mas que governará para uma classe; a burguesia financeira. Entra em campo (jacobinos-Bourbons) e cidade (girondinos-Orléans),81 o poder irá se revezar até que os desdobramentos históricos culminem na vitória da eleição de Luís Bonaparte (sobrinho). Durante todo este processo poderá ser observada a manipulação das classes dominantes sobre as outras, seja em regimes monárquicos ou republicanos. A classe operária, por exemplo, se coloca numa luta armada na Insurreição de Junho82, incitada pela alta burguesia republicana que almeja o domínio e o conseqüente fim da aristocracia financeira. O proletariado não possuía uma estratégia política própria, mas sente-se vencedor de uma briga que não era verdadeiramente sua, e não atenta para as novas coligações que a sociedade francesa vai formar, às pressas, para livrar-se da presunção daquele grupo que também queria o poder político sem saber ao certo para quê. Por isso, os assim chamados insurretos são massacrados de forma brutal quando se levantam contra o que já se constituíra em Partido da Ordem83 e reunia as maiores forças da sociedade francesa. O proletariado é varrido do cenário político e, com eles, também os republicanos democratas (pequeno-burgueses). Estes passam a ser vistos como anarquistas, socialistas ou comunistas. Essa ideologia será construída e disseminada pela classe dominante (alta burguesia republicana) que terá domínio exclusivo sobre o Estado até a eleição de Bonaparte, que, por sua vez, é visto como um acerto de contas da burguesia com tendências monárquicas. A vitória de Bonaparte representava claramente uma esperança tanto dos legitimistas quanto dos orleanistas de realizar suas pretensões de retorno à monarquia. Essas duas facções da sociedade francesa que muito tinham em discordância interna, e isso se dava de forma profunda, porque constava no próprio cerne da reprodução material de cada uma; estiveram unidas pelo interesse de destruição dos insurretos e mantiveram-se unidas, pelos seus anseios políticos, conforme reflete Marx. 81 Legitimistas (Bourbons) e Orleanistas eram duas grandes facções aristocráticas francesas que representavam respectivamente os grandes latifúndios (campo) e finanças industriais (cidade). 82 Resposta do proletariado de Paris às declarações da Assembléia Nacional sobre as reivindicações daqueles. Foi “o acontecimento de maior envergadura na história das guerras civis da Europa” (p 6). No entanto, o proletariado encontrou todas as grandes forças da sociedade unidas contra ele. Foi um grande massacre na história do proletariado. 83 Formado pela aristocracia financeira, a burguesia industrial, a classe média, a pequena burguesia, o exército, o lupem-proletariado (organizado em Guarda Móvel), os intelectuais de prestígio, o clero e a população rural todos unidos contra o proletariado. Revista Eletrônica Inter-Legere: Número quatro, dois anos 139 Poder-se-ia travar uma pequena discussão sobre a própria construção social daqueles indivíduos, muitos nascidos em meio a uma harmonia simulada (através do partido da Ordem) e, portanto, feitos sujeitos numa realidade social na qual os posicionamentos políticos nem sempre condiziam com as intenções reais e profundas. Sendo assim, as antipatias entre as duas facções (Orlèans e Bourbons) estavam inscritas nos corpos daqueles que, criados e formados sobre as bases daquelas condições materiais de existência e relações correspondentes, tinham herdado de seus antepassados oposições de natureza peculiar. Ambos queriam o retorno da monarquia; no entanto, se esta fosse restaurada não poderiam as duas facções governar juntas. Uma certamente suplantaria a outra porque, na essência formadora de cada grupo, constavam diferenças importantes sobre as próprias condições de existência. Entretanto, como acaba de ser discutido, a burguesia era extremamente heterogênea e foi isso que possibilitou que Bonaparte fosse, aos poucos, através de manobras políticas, enfraquecendo o Estado representativo até destruí-lo por completo e instalar o Bonapartismo através do golpe de Estado. Os desejos internos desses grupos não somente divergiam, mas as contradições existentes, muitas vezes, os colocavam em posição de anulação recíproca de interesses. Isso acabou gerando uma grave crise que fez com que o partido não conseguisse mais representar a classe a que se propunha e terminasse por se desintegrar em seus pequenos componentes. E, essa falta de identificação fez nascer no seio da sociedade francesa o desejo por um “governo forte” (MARX, 2001, p. 38) que pudesse restabelecer a unidade política e não pusesse em risco a estabilidade econômica da França. Ou seja, o poder político, outrora almejado e adquirido com tanto esforço, tantas conspirações, fora perdido por incapacidade de gerir os interesses de forma coerente que agradasse Bourbons e Orlèans na defesa do capital. A burguesia se despede então do sonho do selfgovernment84 e irá ter um novo governo centralizado. “A França, portanto, parece então ter escapado do despotismo de uma classe apenas para cair sob o despotismo de um indivíduo e o que é ainda pior, sob a autoridade de um indivíduo sem autoridade” (MARX, 2001, p. 53). A estada de Luís Bonaparte no governo, como imperador, assume um discurso de tentar representar grupos antagônicos, pensando talvez numa possibilidade de amortecer os impactos de uma classe sobre a outra. “Bonaparte gostaria de aparecer como o benfeitor patriarcal de todas as classes. Mas não pode dar a uma classe sem tirar de outra” (MARX, 2001, p.59). No entanto, era impossível que isso pudesse ser entendido como democracia. Ora, quando se tratava das diferenças internas da aristocracia apenas a separação entre campo e cidade causou tanto mal-estar. Como conseguir abranger a diversidade que era agora a sociedade francesa, depois de um longo processo de otimização da divisão social do 84 Termo em inglês que significa autogoverno. Revista Eletrônica Inter-Legere: Número quatro, dois anos 140 trabalho? Onde as diferenças agora estavam cada vez mais aparentes. Ou seja, o que Bonaparte queria não passava de uma quimera de glória nacional. E o Estado francês que ele conseguiu, instituir foi marcado pelo limite do antagonismo de classes, no qual se colocavam em pontos extremos o proletariado desamparado e indefeso e a burguesia do capital na outra margem. Esse Estado, chamado de Moderno parecia pairar sobre a sociedade e escondia toda podridão de uma realidade miserável para as massas, e luxo e suntuosidade à classe dominante. Bonaparte quis aparecer como o protetor dos camponeses, mas aqueles camponeses conservadores que não apresentavam perigo, e por não possuírem um sentimento de classe e serem visivelmente desorganizados, necessitavam de um representante. Por outro lado, a outra parte dos camponeses, tidos como revolucionários, sofreram diversas represálias durante o período em que Napoleão III (auto-intitulado) esteve no poder. Muitos foram mortos em confronto direto. O fato é que o período designado de Segundo Império por Napoleão III foi um momento de multiplicação dos rapaces, mas, por outro lado, de grande florescimento da indústria nacional. O Estado forte e centralizado deu ânimo aos investidores e a prosperidade da burguesia alcançou índices jamais vistos. Isso fez nascer na sociedade francesa um sentimento de nacionalismo muito forte, denominado chauvinismo85. Este mesmo nacionalismo unido a outros fatores sociais e políticos acabou trazendo decadência ao império Bonapartista anos mais tarde. Esses acontecimentos são tratados em outra obra do mesmo autor, intitulada de ”Guerra civil em França86”. O 18 Brumário de Luís Bonaparte é um livro que retrata muito bem a conjuntura social e política da França no século XX. Nele, Marx trata direta ou indiretamente de teses importantes do materialismo histórico dialético, como: teoria das lutas de classes, da revolução proletária, a doutrina do Estado e ditadura do proletariado. No entanto, o objeto central deste livro é analisar os fatores histórico-sociais (lutas de classes) que criaram “circunstâncias e condições que possibilitaram a um personagem medíocre e grotesco desempenhar um papel de herói” (Prefácio de Marx para a segunda edição), fazendo com que o modelo de Estado experimentado por Bonaparte tenha se tornado tão forte e sólido a ponto de servir como base de análise para outros Estados ditatoriais na atualidade. 85 O termo deriva do nome de Nicolas Chauvin, soldado do Primeiro Império Francês, que sob comando de Napoleão Bonaparte demonstrou seu enorme amor por seu país sendo ferido dez vezes em combate, mas sempre retornando aos campos de batalha. Inicialmente, o vocábulo foi usado para designar pejorativamente o patriotismo. 86 Esta obra trata dos eventos que marcaram a primeira tentativa de governo proletário com a instauração da





































Em 31 de março de 1964, militares contrários ao governo de João Goulart (PTB) destituíram o então presidente e assumiram o poder por meio de um golpe. O governo comandado pelas Forças Armadas durou 21 anos e implantou um regime ditatorial. A ditadura restringiu o direito do voto, a participação popular e reprimiu com violência todos os movimentos de oposição. 
Na economia, o governo colocou em prática um projeto desenvolvimentista que produziu resultados bastante contraditórios, já que o país ingressou numa fase de industrialização e crescimento econômico acelerados, sem beneficiar a maioria da população, em particular a classe trabalhadora.
Antecedentes do golpe
Os militares golpistas destituíram do poder o presidente João Goulart, que havia assumido a presidência após a inesperada renúncia de Jânio Quadros (PTN), em 1961. Sua posse foi bastante conturbada e só foi aceita pelos militares e pelas elites conservadoras depois da imposição do regime parlamentarista. Essa fórmula política tinha como propósito limitar os poderes presidenciais, subordinando o Executivo ao Legislativo. Goulart, contudo, manobrou politicamente e conseguiu aprovar um plebiscito, cujo resultado restituiu o regime presidencialista.
O presidente, entretanto, continuou a não dispor de uma base de apoio parlamentar que fosse suficiente para aprovar seus projetos de reforma política e econômica. A saída encontrada por Goulart foi a de pressionar o Congresso Nacional por meio de constantes mobilizações populares, que geraram numerosas manifestações públicas em todo o país.
Ao mesmo tempo, a situação da economia se deteriorou, provocando o acirramento dos conflitos de natureza classista, entre os que defendiam reformas e distribuição de renda e os opositores a estas medidas. Todos esses fatores levaram, de forma conjunta, a uma enorme instabilidade institucional, que acabou por dificultar a governabilidade.
Nessa conjuntura, o governo tentou mobilizar setores das Forças Armadas, como forma de obter apoio político, mas a medida colocou em risco a hierarquia entre os comandos militares e serviu como estímulo para o avanço dos militares golpistas.
Em 1964, a sociedade brasileira se polarizou. As classes médias, as elites agrárias e os industriais se voltaram contra o governo e abriram caminho para o movimento golpista.
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Veja fotos históricas do golpe de 1964 e da ditadura militar (1964-1985)15 fotos

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Multidão se reúne em frente à Catedral da Sé, na região central de São Paulo, durante a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em 19 de março de 1964. O movimento foi uma reação do clero conservador, do empresariado e da direita, em geral, contra as reformas do então presidente João Goulart (PTB). O presidente acabou deposto no dia 31 de março no golpe militarVEJA MAIS >Imagem: Folha Imagem
Os governos militares
O marechal Humberto de Alencar Castello Branco (Arena) esteve à frente do primeiro governo militar (1964 a 1967) e deu início à promulgação dos Atos Institucionais. Entre as medidas mais importantes, destacam-se: suspensão dos direitos políticos dos cidadãos; cassação de mandatos parlamentares; eleições indiretas para governadores; dissolução de todos os partidos políticos e criação de duas novas agremiações políticas: a Aliança Renovadora Nacional (Arena), que reuniu os governistas, e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), que reuniu as oposições consentidas.
Em fins de 1966, o Congresso Nacional foi fechado e foi imposta uma nova Constituição, que entrou em vigor em janeiro de 1967. Na economia, o governo revogou a Lei de Remessa de Lucros e a Lei de Estabilidade no Emprego, proibiu as greves e impôs severo controle dos salários. Castello Branco planejava transferir o governo aos civis no fim de seu mandato, mas setores radicais do Exército impuseram a candidatura do marechal Artur da Costa e Silva (Arena), que assumiu o poder de 1967 a 1969.
O marechal enfrentou a reorganização política dos setores oposicionistas, greves e a eclosão de movimentos sociais de protesto, entre eles o movimento estudantil universitário. Também neste período os grupos e organizações políticas de esquerda organizaram guerrilhas urbanas e passaram a enfrentar a ditadura, empunhando armas, realizando sequestros e atos terroristas. O governo, então, radicalizou as medidas repressivas, com a justificativa de enfrentar os movimentos de oposição.




























































Em 31 de março de 1964, militares contrários ao governo de João Goulart (PTB) destituíram o então presidente e assumiram o poder por meio de um golpe. O governo comandado pelas Forças Armadas durou 21 anos e implantou um regime ditatorial. A ditadura restringiu o direito do voto, a participação popular e reprimiu com violência todos os movimentos de oposição. 
Na economia, o governo colocou em prática um projeto desenvolvimentista que produziu resultados bastante contraditórios, já que o país ingressou numa fase de industrialização e crescimento econômico acelerados, sem beneficiar a maioria da população, em particular a classe trabalhadora.
Antecedentes do golpe
Os militares golpistas destituíram do poder o presidente João Goulart, que havia assumido a presidência após a inesperada renúncia de Jânio Quadros (PTN), em 1961. Sua posse foi bastante conturbada e só foi aceita pelos militares e pelas elites conservadoras depois da imposição do regime parlamentarista. Essa fórmula política tinha como propósito limitar os poderes presidenciais, subordinando o Executivo ao Legislativo. Goulart, contudo, manobrou politicamente e conseguiu aprovar um plebiscito, cujo resultado restituiu o regime presidencialista.
O presidente, entretanto, continuou a não dispor de uma base de apoio parlamentar que fosse suficiente para aprovar seus projetos de reforma política e econômica. A saída encontrada por Goulart foi a de pressionar o Congresso Nacional por meio de constantes mobilizações populares, que geraram numerosas manifestações públicas em todo o país.
Ao mesmo tempo, a situação da economia se deteriorou, provocando o acirramento dos conflitos de natureza classista, entre os que defendiam reformas e distribuição de renda e os opositores a estas medidas. Todos esses fatores levaram, de forma conjunta, a uma enorme instabilidade institucional, que acabou por dificultar a governabilidade.
Nessa conjuntura, o governo tentou mobilizar setores das Forças Armadas, como forma de obter apoio político, mas a medida colocou em risco a hierarquia entre os comandos militares e serviu como estímulo para o avanço dos militares golpistas.
Em 1964, a sociedade brasileira se polarizou. As classes médias, as elites agrárias e os industriais se voltaram contra o governo e abriram caminho para o movimento golpista.
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Multidão se reúne em frente à Catedral da Sé, na região central de São Paulo, durante a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em 19 de março de 1964. O movimento foi uma reação do clero conservador, do empresariado e da direita, em geral, contra as reformas do então presidente João Goulart (PTB). O presidente acabou deposto no dia 31 de março no golpe militarVEJA MAIS >Imagem: Folha Imagem
Os governos militares
O marechal Humberto de Alencar Castello Branco (Arena) esteve à frente do primeiro governo militar (1964 a 1967) e deu início à promulgação dos Atos Institucionais. Entre as medidas mais importantes, destacam-se: suspensão dos direitos políticos dos cidadãos; cassação de mandatos parlamentares; eleições indiretas para governadores; dissolução de todos os partidos políticos e criação de duas novas agremiações políticas: a Aliança Renovadora Nacional (Arena), que reuniu os governistas, e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), que reuniu as oposições consentidas.
Em fins de 1966, o Congresso Nacional foi fechado e foi imposta uma nova Constituição, que entrou em vigor em janeiro de 1967. Na economia, o governo revogou a Lei de Remessa de Lucros e a Lei de Estabilidade no Emprego, proibiu as greves e impôs severo controle dos salários. Castello Branco planejava transferir o governo aos civis no fim de seu mandato, mas setores radicais do Exército impuseram a candidatura do marechal Artur da Costa e Silva (Arena), que assumiu o poder de 1967 a 1969.
O marechal enfrentou a reorganização política dos setores oposicionistas, greves e a eclosão de movimentos sociais de protesto, entre eles o movimento estudantil universitário. Também neste período os grupos e organizações políticas de esquerda organizaram guerrilhas urbanas e passaram a enfrentar a ditadura, empunhando armas, realizando sequestros e atos terroristas. O governo, então, radicalizou as medidas repressivas, com a justificativa de enfrentar os movimentos de oposição.


























































































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